terça-feira, 27 de agosto de 2013

Eu por nós.



Me encontro em tantas outras. Não cabe depressão em mim. Esse é o mantra que tento repetir, tem horas que falha. Na verdade, acho até que a depressão é o que me faz ser feliz. Sou, me esforço para ser. E acabo sendo, de verdade. No riso dos outros encontro o meu gozo. Não há nada que me deixe mais completa do que a felicidade dos que me acompanham.

Aos outros, tantos outros, que com o olhar matam. Julgam. Invejam. Têm medo. Dou desprezo. Admito que não acho a forma mais eficiente de convencer ou ensinar sobre minha condição sexual, mas assumo que tentar demais isso já me expôs tantas vezes que pareço não ligar mais. Fadiga. Cansei, amiga!

Ando lendo um livro que uma amiga me indicou, talvez seja por isso que resolvi escrever. Quase como inveja do autor. Não sei criar ficções, por isso, faço de mim ficção. Apenas pra poder escrever mais tarde. Pratico diariamente esse exercício.

Mas não pense que sou falsa, superficial ou personagem. Sou personagem de mim, do momento. Asas para a parte que já afoguei. Voa bem, voa linda! E você vai dizer que é o que acha que é? Se assume que é o que tenta ser, já é um grande passo!

A correria consome meus dias. Me sinto animal, busco alimento diário. Ler no transporte e escrever sob essa luz fraca são a parte do meu dia que posso reviver o pouco que passei por hoje. Mas não faço disso depressão. Essa é a condição que estou. O fato de ter pau e peito no mesmo corpo faz com que pensem que sou incompetente? Vulgar?

Pessoal aqui do quarto está reclamando, querendo dormir e luz está atrapalhando. Amanhã, vou num bar, tô tentando um acordo com eles. Talvez faça shows para aumentar a frequência. A lapa está morta, morreu com a nossa saída compulsória.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

A escuridão

Total escuridão. Seria a morte? O fundo do poço? Se sentia totalmente perdida. Se sentia enjoada. Cansada. Cada músculo de seu corpo se retorcia ao mesmo tempo. ESGOTADA!

Putaquiupariu! Ai, se isso for a morte, já comecei mal... falando uma porrada de palavrão!

Com um cuidado foi tateando o seu redor, centímetro por centímetro. Sua testa gotejava, o calor era intenso. A mão chega a um obstáculo. Fervia! Seus dedos habilidosos subiam lentamente naquela montanha desconhecida. A visão era nula. O tato aos poucos foi ficando mais sensível... Em um súbito momento, puro instinto, os cinco dedos avançaram juntos, feito um bote, a presa estava imobilizada, petrificada, rígida, cheia de sangue pulsante. Um flash intenso veio a sua mente, chegando a fazer parte de seu aplique cair. A noite passada veio a tona!

Maldito Big Apple! Falei que não bebo essas acetonas baratas! Cadê a luz desse moquifo?

Que merda é essa Salomé? Acorda os outros gritando!?

Ai, cadê a luz, bee! Sei nem onde tô!

Imensidão clara. A luz amarela ia se confortando nos seus olhos, o que não confortava era a parede de tijolo. Tem nem reboco!

Bom dia, Boymagia! Queria saber onde a gente está, só pra eu pegar um ônibus pra casa.

Vamos aproveitar mais um pouquinho agora de manhã... Ainda tem espaço nas minhas costas pra mais arranhões seus.

Ain, não vem com paixão a essa hora que meu pau nem sobe! Apesar de não lembrar, sei que tu é passiva só pela carinha!

Num chute foi parar do lado de fora, toda errada. Metade do cabelo tinha se perdido na noite, o caráter foi por inteiro. Aproveitou o clima pra ficar com os saltos nas mãos e sentir um pouco do calor da manhã nos pés. Saiu a caça de informação. Não sabia o porquê , mas quando ela chegava perto, as pessoas se afastavam. Procurou o Cepacol na bolsa, mas acreditou ter bebido na noite anterior. Andou uns 40 minutos até que viu um ônibus para o Méier. Passava pertinho de sua casa.

Com o charme e a magia conquistou o trocador e o motorista, que a deixaram entrar sem pagar. Como o de costume, o 688 fazia um tour pela zona feia da cidade, mas era o que tinha para a segunda de folga! Aproveitou o tempo para retocar a maquiagem. Mas quando enquadrou o olho no espelhinho 2x2:

Cacete! Dormi de lente... Cadê a outra? Ai, Jesus. Tô parecendo cega! Com um olho azul e o outro castanho. Será que tá atrás do olho!?

O desespero só aumentou, mas quando se deu conta estava no ponto final. Logo que desceu do ônibus, avistou o Hospital Salgado Filho.

Gente, vou caçar um médico pra ver onde foi parar minha lente! Cara, comprei essa semana na Uruguaiana, não é possível! Mas antes preciso ligar pra Brunna, caso eu precise ficar internada!

Correu para um orelhão próximo. Surpresa.


Gente, Brunninha tá pesada no marketing! Mais de 30 papéis no mesmo orelhão, só divulgando a geba da pessoa!  Alô! Ô, garota! Vem aqui no Salgado Filho me socorrer! Tô te falando! Meu olho tá necrosando. Tá... Tá todo vermelho! Olha, eu fui dormir na casa do cafuçu. Acordei toda suada, sem lembrar de nada! O quê!? Você me viu ontem caída!? Ahh, não acredito! Acabaram meus créditos! Ah, eu vou é pra casa tirar essa história a limpo, aproveito faço uma reza pra santa luzia que esse olho melhora em dois tempos!

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Prazer, Salomé!

Já era tempo... A caixa de email anunciava uma resposta de um currículo que tinha enviado para um bar no centro! Fase 2: Abriu e a resposta era positiva! Não podia se conter. Colocou  Monáe pra tocar no notebook, com os dedos, bagunçou o cabelo e tomou uma sapatada na cabeça.

Olha a hora, sem noção, tem gente dormindo pra poder fazer dinheiro, porra!

Fingindo não ligar, levantou, caçou na bolsa o fone de ouvidos, uma pena só estar 
funcionando o da esquerda. Conteve-se em mexer a cabeça. Eita, felicidade!

Já era tarde, a reunião era pela manhã. Melhor dormir. A fase mais difícil estava por vir.

Apressada, acordou num pulo. A dor nas costas piorava, já não dava mais para não ter uma cama. Evitou perceber as paredes descascadas, fixou o olhar no espelho da parede. Não sabia o que era pior. Correu pro banho, lavou só o essencial. A maquiagem escondia as impurezas.  Calçou o salto indo para 1,85, coisa grande.  Resolveu pelo look moderno e sexy, na verdade, era o único mais formal que tinha. Saia preta justa até os joelhos, blusa social por dentro da calcinha. Entre 2 e 3, optou pelos 3 botões abertos, deixando a mostra o decote. Saiu atrasada.

Pelas ruas foi roubando olhares. Quanto mais, mais rebolava. O centro nunca tinha sido tão longe! Chegava a Atlântica, mas não chegava a Rio Branco! Atrás daquela pose determinada/séria, escondia uma ansiedade sem igual. Cansada dessa porra de depender dos outros. Morar com mais cinco e dividir o cômodo, ou melhor, o chão com quatro é impossível. Nenhuma beleza sobrevive. Preciso desse emprego! Já dizia o tema da redação do ensino médio, “O trabalho dignifica o homem”. Nossa, quanto tempo fazia!

A fachada do bar parecia ter sido reformada, lá pela década de 70. Mas era o que tínhamos, no pior, fingíamos um vintage! Ajeitou o que deu, repassou o batom vermelho, subiu um botão e passo a passo foi se encaminhando da porta do estabelecimento. Ela nem sabia o nome daquela espelunca, mas não importava!

Oi, recebi uma resposta sobre a vaga de emprego! Me pediram para vir aqui hoje para vocês me conhecerem... Com quem eu devo falar?

Pois não, é comigo mesmo. Mas deve ter havido um engano. O selecionado se chamava Carlos, senhora.

Exato, na identidade sou Carlos, mas pode me chamar de Salomé.